Registros do Banimento do Yao do Tianbao - Novel - Extra 10
- Home
- Registros do Banimento do Yao do Tianbao - Novel
- Extra 10 - Deixando o Passo Yang, Não Haverá Velhos Amigos.
Nota: O título “西出阳关无故人” é uma linha famosa do poeta chinês Wang Wei, refletindo uma despedida melancólica, onde o Passo Yang representa um ponto de passagem na fronteira oeste da China antiga.
✧*๑✧*๑✧*๑✧*๑✧*๑✧*๑✧*๑✧*๑✧*
“Você ainda se lembra do dia em que nos conhecemos?”
“Que dia? Não me diga que foi naquele dia. A shifu disse que nos conhecemos quando éramos muito jovens…”
“Um deles manterá a Chama Sagrada acesa.”
“O outro guardará fielmente esta chama até o dia em que ela se extinguir.”
A Sacerdotisa Zoroastrista, no Templo de Bazin, assistiu ao nascimento de seu segundo filho. Ela nomeou o menino “Tegla”, que significa “Chama que Arde nas Cinzas”. Sua mãe era a Princesa Sassânida Morido Isai.
Um ano atrás, no mesmo lugar, ela também auxiliou no parto da esposa de Delan, o Sábio Guerreiro. Aquele menino foi chamado de “Qiong”, que significa “Protetor da Chama”.
“Ele e ele”, disse a sacerdotisa com serenidade, “guiarão o futuro de vocês.”
O apóstolo entregou à rainha Ashina Qiong, de um ano, para que fosse criado ali. A rainha, ao ver o bebê, esboçou um sorriso melancólico e comentou: “Ele tem olhos gentis como os de sua mãe…”
“A esposa de Delan já se foi.”
A sacerdotisa observava Ashina Qiong, que, com seus olhos âmbar, piscou e agarrou seu dedo.
“Delan e Isai estão em Bagdá lutando para recuperar o que os profetas perderam…”, a sacerdotisa disse lentamente, “deixe-os se encontrarem, e então Qiong terá que partir.”
O apóstolo mostrou Ashina Qiong à rainha que acabara de dar à luz, e o levou embora. No templo, só restava o choro de Tegla – ecoando pela primeira vez no mundo.
Aquele teria sido o primeiro encontro deles?
Talvez eles só se conhecessem de verdade depois de muito, muito tempo.
“Não, não, você nem abriu os olhos naquele dia. Como isso pode ser considerado como se conhecendo! Estou falando daquele dia.”
“Ah… agora eu me lembro, nevou em Bagdá.”
“Viu, eu disse que você se lembrava.”
A-Tai, é claro, se lembrava daquele dia…
Aquela foi uma noite de inverno cheia de combates e gritos. Bagdá foi coberta por uma neve rara, que não se via há cem anos. Seu tio havia sido traído, e o Clã Isai escondido na cidade foi vendido. Antes que o Exército Tang chegasse, o jardim secreto nas profundezas do mercado havia sido cercado e incendiado. Os soldados vestidos de preto haviam começado uma busca de casa em casa.
“Não podemos mais esperar pelas tropas Tang!” O último ancião do Clã Isai gritou. “Deixe Tegla acender a Chama Sagrada! Vamos derrubar o Califa esta noite!”
A-Tai, que tinha oito anos, estava usando o manto de um sumo sacerdote, tremendo, ele deu meio passo para trás. Os guerreiros na sala estavam gritando, mas ele nem conseguia ouvir o que eles gritavam. Alguém agarrou o colarinho de A-Tai e disse muitas coisas para ele com urgência. Seu tio forçou o Anel da Chama Sagrada em sua mão. O anel foi colocado no polegar de A-Tai, então, eles o pegaram e correram para fora do Jardim Secreto, matando seu caminho para fora.
Naquela noite, os discípulos escondidos em Bagdá finalmente arrancaram seus véus e turbantes, sacaram suas cimitarras e acenderam a Chama Sagrada em vários pontos da cidade. Os guardas do Califa montaram suas bestas e atiraram nos hereges por toda parte.
Sangue respingou no rosto jovem de A-Tai, enquanto seu clã matava uns aos outros em todos os lugares – por causa dos diferentes deuses em que acreditavam.
“Rezem!”
Isai colocou A-Tai na frente do altar no norte da cidade e rugiu: “A Chama Sagrada reacenderá!”
O pequeno corpo de A-Tai foi pressionado contra o chão no centro do altar.
“Eu não consigo fazer isso”, A-Tai soluçou e disse com a voz trêmula, “A Chama Sagrada me ignora. Deus Ahura Mazda nunca me deu uma semente da chama… eu não consigo fazer isso… eu não consigo fazer isso…”
“Então morra!” Isai rugiu com raiva. “Morra! Sacrifique-se nas cinzas!”
O fogo quase destruiu Bagdá, as chamas devoraram as casas e ruas da cidade. As chamas do zoroastrismo, as espadas afiadas dos islâmicos e os sons sibilantes das flechas voando pelo ar o deixaram extremamente aterrorizado.
“Não consigo”, A-Tai fechou os olhos e agarrou o Anel da Chama Sagrada firmemente com o polegar. Ele gritou: “Não consigo fazer isso… A Chama Sagrada foi extinta, ela não está mais queimando…”
Até que viu o jovem caminhando pela matriz do altar à sua frente.
Ashina Qiong, de nove anos, tinha a cabeça enrolada em trapos. Seus olhos âmbar carregavam uma frieza diferente aos das outras crianças quando ele pisou na borda da matriz.
“Leve-o embora.”
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Oito anos depois, o Sábio Guerreiro Delan retornou a Bagdá com seu filho. Ele disse em voz profunda: “Está tudo acabado agora. Vão viver suas vidas. Você não tem mais nenhuma responsabilidade sobre seus ombros, então não há necessidade de nos vingar…”
Ashina Qiong levantou a cabeça para olhar para seu pai.
Delan deu um tapinha na cabeça de Ashina Qiong antes de olhar para as costas de Isai no altar.
Sob a plataforma alta estavam todas as tropas dos guerreiros vestidos de preto, e o povo sassânida quase foi massacrado. Somente no Palácio Imperial do Califa, em frente ao altar, estava o Sultão em vestes luxuosas, sob a proteção de um grupo de guerreiros, observando de longe os derrotados zoroastrianos no altar.
Isai segurou uma tocha e a jogou na matriz. As chamas subiram para o céu, transformando-se em uma luz branca que disparou para o alto.
O Sábio Guerreiro Delan gritou: “Qiong! Depressa!”
Ashina Qiong imediatamente se curvou e correu para o mar de chamas.
A-Tai se virou para olhar a cena, mas Ashina Qiong o derrubou no chão.
As chamas incendiaram seu cabelo e sobrancelhas. A-Tai gritou, mas Ashina Qiong protegeu sua cabeça. As duas crianças caíram da plataforma alta que tinha quase dez zhang de altura, como meteoros em chamas.
O corpo de Isai foi queimado até ficar carbonizado no altar.
“Deixe isso para lá”, sussurrou Delan, “Isai, nesta vida, nós finalmente nos libertamos.”
Segurando a roda dourada na horizontal, Delan atraiu as chamas no altar e se transformou em um raio de luz na plataforma em chamas, que voou em direção ao califa à distância.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Ashina Qiong, segurando o último herdeiro sassânida, caiu com um estrondo na água, levantando uma chuva de respingos no fosso ao redor da cidade, ele se sentiu tonto e viu vagamente a última glória de seu pai sob o manto da noite.
Aquela noite marcou oficialmente a queda do Império Sassânida.
“Huff… Huff…”
Ashina Qiong pegou A-Tai, que era apenas um ano mais novo que ele, e correu o mais rápido que pôde no deserto. A-Tai quase caiu várias vezes, mas Ashina Qiong o segurou firmemente.
“Fuja!” Ashina Qiong gritou. “Se você ainda quer viver!”
A-Tai se curvou, respirando com dificuldade.
Desde o nascimento, ele era tratado como uma ferramenta, sendo levado do templo e entregue a seu tio Isai. Todos olhavam para ele como se estivessem olhando para a herança do Império Sassânida. Ninguém se importava com seus pensamentos, muito menos com sua vida ou morte. Mesmo no final, quando seu tio não tinha esperança de restaurar seu império, seu pensamento final foi queimá-lo até a morte como um símbolo de gratidão a todo o clã.
Neste momento, A-Tai finalmente tomado por uma raiva inexplicável, se livrou da mão de Ashina Qiong e gritou: “Ir embora?! Se você quer ir, vá sozinho!”
Ashina Qiong, sem dar nenhuma explicação, agarrou a gola de A-Tai com uma mão e disse cruelmente em seu ouvido: “Lixo, você é um lixo!”
Os olhos de A-Tai se arregalaram de repente. Ele tinha ouvido essa frase inúmeras vezes, sempre ditas subconscientemente por seu tio e pelos ministros exilados durante suas discussões, e ele as ouvia escondido.
Ele sabia que todos depositavam esperança nele, esperando que um dia, como sumo sacerdote, convocasse a Chama Sagrada dos céus para purificar tudo e reduzir seus inimigos a cinzas.
Mas não importava como ele cultivasse, ele era incapaz de convocar a Chama Sagrada, nem de usar a herança do Império Sassânida. Isai e seus companheiros de clã já acreditaram que o Deus Ahura havia abandonado os Sassânidas, ou que esse sobrinho dele não era o profeta destinado a guiar os Sassânidas para uma nova glória.
A única vez foi quando ele assumiu como sumo sacerdote. A-Tai finalmente teve sucesso em invocar as chamas, que dançaram ao redor de seu corpo, formando as runas de luz eterna do Zoroastrismo.
Assim, a esperança dos homens do clã foi reacendida.
No entanto, A-Tai não realizou nenhum milagre por um ano inteiro depois disso.
Sua confiança abalada, crença devota e desejo pela glória do passado… Incontáveis esperanças, decepções e até mesmo desespero, teceram uma enorme rede de rumores da qual ele não conseguia se libertar.
Finalmente, esta noite, todos estavam mortos, e ele estava finalmente livre.
“Se você for pego pelo Exército Vestido de Preto”, Ashina Qiong abaixou a voz, como uma fera furiosa, e ameaçou, “você sabe o que vai acontecer? Você sofrerá a humilhação mais dolorosa do mundo, e só então você morrerá!”
No entanto, o rosto delicado de A-Tai, que era tão delicado quanto o de uma garota, não mostrou o menor sinal de pânico. Essa frase já havia sido dita a ele por mais de uma pessoa — qual seria o destino de um príncipe indefeso, nas mãos de seus perseguidores? Ele já havia vislumbrado seu próprio destino sombrio em inúmeros pesadelos.
“Se você não quer morrer, venha comigo!” Ashina Qiong disse, então observou a situação ao redor, e quando ele estava prestes a sair… A-Tai puxou a adaga da cintura de Ashina Qiong, a pressionou contra sua própria garganta, recuando meio passo.
“Tegla, pare!” Ashina Qiong ao ver aquela cena, sentiu um frio percorrer sua espinha.
“Não faço ideia de quem você seja.” Um sorriso triste apareceu nos lábios de A-Tai. “Mas para mim, tudo isso finalmente acabou! Cansei de ser tratado como uma marionete, manipulado à vontade, e ninguém pode mais me controlar…”
Ashina Qiong: “…”
“Você pode ir”, disse A-Tai. “Não importa quem você seja, obrigado por me acompanhar até o fim desta jornada…”
“Eu sou seu cavaleiro!” Ashina Qiong, em desespero, finalmente revelou sua identidade. “Eu sou seu cavaleiro! Meu nome é Ashina Qiong! Pare!”
A-Tai franziu a testa e olhou para Ashina Qiong.
Ashina Qiong lentamente estendeu a mão e estava prestes a pegar a adaga na mão trêmula de A-Tai quando uma flecha voou não muito atrás dele e, de repente, ele começou a sangrar.
Ashina Qiong caiu sobre A-Tai, e as duas crianças rolaram ladeira abaixo.
Risadas desenfreadas soaram. Dois soldados vestidos de preto os alcançaram, montaram em seus cavalos e desceram. Eles guardaram seus arcos e flechas, giraram seus chicotes e, no momento que estavam prestes a chicotear Ashina Qiong, que parecia imóvel, quando, em um ato de proteção, ele usou um braço para cobrir A-Tai, girou o corpo e arrancou a flecha cravada em seu ombro!
O sangue espirrou. Então, Ashina Qiong atirou uma flecha e acertou a garganta do soldado vestido de preto!
A outra pessoa não esperava que esse garoto fosse tão corajoso. Ele imediatamente virou seu cavalo.
Ashina Qiong atirou outra adaga e matou a segunda pessoa.
Ashina Qiong empurrou A-Tai para cima do cavalo e gritou: “Você sabe cavalgar?”
“Não… eu não sei”, respondeu A-Tai com a voz trêmula.
Ashina Qiong não teve outra opção senão virar-se para trás e montar no mesmo cavalo que ele, e juntos galoparam em direção ao fim da planície.
A-Tai se virava de vez em quando, mas acidentalmente esbarrou em Ashina Qiong, que estava coberto de sangue.
“Não olhe para trás!” Ashina Qiong disse.
Atrás deles, havia um exército de guerreiros vestidos de preto, avançando como uma maré, quase 30 mil guerreiros correram em massa para capturar Tegla e aniquilá-lo completamente!
“Vá embora!” A-Tai disse. “Não se preocupe comigo!”
Os olhos de Ashina Qiong gradualmente ficaram embaçados. A perda excessiva de sangue deixou seu corpo inteiro frio. Ele inconscientemente pressionou as costas de A-Tai, e as mãos que seguravam as rédeas também começaram a cair sem força, descansando nas coxas de A-Tai.
“Meu pai… para te salvar… já morreu”, disse Ashina Qiong lentamente. “Minha missão é… te proteger… infelizmente… cheguei tarde demais. Eu sei… isso é… injusto com você… apenas trate isso como, viver para mim… um estranho…”
O coração de A-Tai parecia estar suspenso no ar no momento em que o cavalo de guerra saltou. De repente, uma chuva de flechas atingiu o cavalo, jogando ambos violentamente ao chão, no meio do campo aberto.
Ashina Qiong abraçou A-Tai e caiu do cavalo.
Os dois rolaram no chão. As vestes cerimoniais pretas de A-Tai estavam rasgadas em farrapos, mas ele ainda segurava a mão de Ashina Qiong com força.
Os dedos de Ashina Qiong se afrouxaram lentamente enquanto sussurrava: “Corra…”
A-Tai abraçou Ashina Qiong e se ajoelhou no meio do campo aberto. Os soldados vestidos de preto os cercaram de todos os lados, dezenas de milhares deles levantando suas bestas.
A-Tai abraçou Ashina Qiong com força enquanto soltava um grito rouco e furioso.
Num instante, um raio de fogo divino desceu dos céus, e o anel da Chama Sagrada brilhava intensamente, formando um anel de fogo que se expandiu varrendo à frente deles, como um redemoinho de chamas!
O deserto se transformou em um inferno, e dezenas de milhares de pessoas foram enterradas em um mar de fogo. Até onde os olhos podem ver, a terra estava chamuscada, e inúmeras faíscas negras subiam para o céu.
No fim do inferno, o Exército Tang, que havia atravessado montanhas e rios, irrompeu nas fronteiras da batalha.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
“Ele não consegue controlar seu poder”, a velha sacerdotisa sussurrou no jardim. “Durante todo o tempo que Isai o levou, eu sempre o avisei que a missão de Tegla era reacender a Chama Sagrada, não para se tornar uma ferramenta para massacrar cidades.”
O general do Exército Tang ficou de costas para a entrada principal do Templo Sagrado.
“Não me importa qual seja seu plano”, disse o general seriamente, “Isai não esperou que chegássemos e lançou um ataque com antecedência. Como posso voltar e explicar a Sua Majestade?”
“General Gao”, disse a sacerdotisa com um sorriso, “por favor, diga ao Khan Celestial¹ que sinto muito.”
Aquele general era Gao Xianzhi!
Gao Xianzhi andou pelo salão e disse à sacerdotisa: “Tenho que levá-lo embora e devolvê-lo ao Khan Celestial.”
“Ele irá”, sussurrou a sacerdotisa, “mas não agora. Qiong, o que você está fazendo?”
Lá fora, ouvindo secretamente, com o corpo coberto de feridas, Ashina Qiong imediatamente se virou, encostando-se em um pilar de pedra do lado de fora da porta.
Dentro do templo, Gao Xianzhi disse novamente: “Vocês não podem proteger Isai. Sacerdotisa, você está velha demais.”
“Ele tem seus cavaleiros”, disse a sacerdotisa, “Ashina Qiong é filho único do Sábio Guerreiro Delan, ele protegerá Tegla. Tegla e a Grande Tang sempre tiveram uma ligação inseparável. Acredite em mim, com o tempo, ele irá encontrar pessoalmente Sua Majestade, o Khan Celestial.”
Gao Xianzhi disse: “Depois que você morrer, será uma criança de nove anos protegendo uma criança de oito anos.”
Ashina Qiong observou a figura alta de Gao Xianzhi ir embora.
A sacerdotisa apoiou-se na bengala e saiu do templo com dificuldade, dizendo: “Vamos, pequeno cavaleiro, vamos ver como está o pequeno príncipe.”
“Eu não quero ser um cavaleiro!” Ashina Qiong disse em voz baixa.
A sacerdotisa não respondeu, conduzindo-o pelo pátio, dizendo: “Vocês dois nasceram aqui. Sua mãe e a Princesa Isai eram boas amigas.”
Ashina Qiong franziu a testa com força.
A sacerdotisa disse: “Nos dois anos em que vocês nasceram, ainda havia muitos apóstolos no templo, era mais animado do que agora. Depois de tantos anos, muitos mestres morreram. É uma pena.”
O Templo de Bazin já foi o lugar onde Zoroastro, o Patriarca do Zoroastrismo, dava palestras. Também simbolizava a criação do Céu e da Terra. A batalha entre o bem e o mal era como um raio que cortava o céu sombrio.
“Centenas de anos depois, outro profeta escreverá um livro imortal em nome de Zoroastro.” A sacerdotisa disse. “Vi tudo isso nas chamas… Uma nova missão nascerá das cinzas. Mas estando no meio disso, o tempo é nosso maior inimigo…”
“Por quê?” Ashina Qiong perguntou.
A sacerdotisa lançou um olhar de aprovação para Ashina Qiong, ele perguntou: “Por que Tegla não consegue convocar a Chama Sagrada?”
A sacerdotisa perguntou: “É realmente assim?”
A sacerdotisa usou sua bengala para levantar gentilmente as cortinas do quarto e levou Ashina Qiong para dentro.
A-Tai ainda estava deitado inconsciente na cama. Seu corpo era branco e magro, seu rosto era perfeito e lindo e seus longos cílios se moviam levemente, como se ele estivesse produzindo um lindo sonho.
“O milagre já se revelou para você”, disse a sacerdotisa em voz baixa, batendo levemente em Ashina com sua bengala. “Esta é a revelação do Zoroastro para você, caso contrário, como vocês teriam voltado aqui?”
Ashina Qiong disse: “Quer dizer, o Deus do Fogo pode obviamente ajudá-lo no altar, ajudar meu pai! Salvar nosso povo! Por que não faz isso?”
A sacerdotisa sentou-se ao lado do sofá e disse: “Os caminhos do mundo são incertos, o bem e o mal dos céus não seguem um caminho fixo, mas se manifestam em uma única pessoa. Se a Chama Sagrada fosse convocada e queimasse Bagdá, Tegla se tornaria um sacrifício para este desastre. Por outro lado, foi precisamente por isso que o Príncipe conseguiu sobreviver. Você ainda não entendeu?”
Ashina Qiong entendeu aproximadamente que se um milagre fosse convocado na plataforma alta, toda Bagdá seria destruída pelo fogo, o magma jorraria do solo e A-Tai teria que pagar pela vida de todos aqueles que morreram neste desastre.
“Mas não é esse o destino de nossas vidas?” Ashina Qiong disse teimosamente. Nessa frase, ele não disse ‘ele’, mas usou outra palavra — ‘nós’.
“Que destino?” A sacerdotisa perguntou calmamente. “O destino de ser uma oferenda? Tegla está destinado a ser uma oferenda, e você é o cavaleiro leal que envia essa “oferenda” para a morte?”
Ashina Qiong disse teimosamente: “Foi isso que todos me disseram.”
A sacerdotisa disse: “Então, de quem é essa vontade? A vontade de Deus?”
Ashina Qiong não respondeu.
A sacerdotisa: “A vontade dos mortais?”
Ashina Qiong: “…”
A sacerdotisa disse: “Deus nunca disse tais palavras.”
Dito isso, ela levantou sua mão enrugada e, segurando os dedos finos, mas calejados, de Ashina Qiong por praticar com uma adaga, ela colocou-a no peito nu e magro de A-Tai.
Ashina Qiong parecia não querer aceitar tal manipulação e fez o possível para retrair a mão.
“Coloque sua mão no peito dele”, sussurrou a sacerdotisa, “e você sentirá o coração de Tegla.”
“Não!” Ashina Qiong disse.
A-Tai se mexeu desconfortavelmente, como se estivesse prestes a acordar.
Ashina Qiong parecia um pouco assustado. Ele se virou e saiu rapidamente do quarto.
Então, A-Tai finalmente abriu os olhos. A sacerdotisa acariciou gentilmente sua testa.
“Já passou”, disse a sacerdotisa. “Qiong vai te acompanhar.”
Havia um traço de confusão nos olhos de A-Tai.
Daquele dia em diante, Ashina Qiong quase não falou com A-Tai, mas o templo era apenas tão grande.
Depois que A-Tai se recuperou, ele continuou diligentemente seus estudos todos os dias sob a orientação da sacerdotisa, lendo Avesta e passava o resto do tempo ajoelhado diante das brasas no templo, orando.
Ashina Qiong estava no jardim do lado de fora do salão, praticando suas técnicas de assassinato e chutes contra alguns bonecos de madeira, ocasionalmente, ele olhava para A-Tai.
A-Tai tinha uma aparência muito delicada. Seu cabelo estava solto, e havia rubis amarrados em suas tranças. Ele parecia mais uma linda garota. Os moradores da cidade de Bazin que subiam da montanha para levar comida, sempre achavam que A-Tai era a nova sacerdotisa.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
No entanto, a Chama Sagrada não reacendeu, e o príncipe e o cavaleiro raramente conversavam um com o outro, até que a barba cresceu nos lábios de Ashina Qiong…
Com o passar do tempo, eles cresceram gradualmente.
Quando novas folhas brotam das copas das árvores, folhas secas inevitavelmente caem no chão. Em outro outono, em uma noite em que as folhas de bordo no Templo Sagrado perto do Mar de Aral murcharam, a sacerdotisa faleceu.
Antes de morrer, ela sequer deixou qualquer instrução, e A-Tai não sabia para onde o templo sagrado e as brasas do altar iriam no futuro.
Poucos dias depois, A-Tai e Ashina Qiong se despediram da sacerdotisa. Eles a colocaram em uma pequena balsa cheia de flores e a empurraram até o fim do Mar de Aral.
Ashina Qiong imitou o ritual que aprendeu viajando pelo oeste com seu pai quando era criança. Ele disparou um foguete para o céu e as chamas caíram sobre a balsa, como uma lâmpada saindo para o mar, extinguindo-se gradativamente com o vento e as ondas do Mar de Aral.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
【se você não estiver lendo no Dianxia Trads saiba que está lendo em site ladrão! 】
Quando a noite caiu, a única coisa que restou foi o céu noturno aveludado cheio de estrelas cintilantes.
“Eu não entendo”, disse Ashina Qiong.
“Não entende o quê?” A-Tai e Ashina Qiong caminharam lado a lado, subindo lentamente a montanha de volta ao Salão Sagrado.
“Eu não entendo”, disse Ashina Qiong, “agora que a glória de Talas pereceu, e a Chama Sagrada está finalmente extinta, e os sassânidas são passado, e a partir de agora, você não precisa mais fazer nada pelo seu povo, por que você permanece aqui?”
“Você também não está aqui?” A-Tai respondeu.
Ashina Qiong queria dizer: ‘É porque não tenho para onde ir.’ Mas quando as palavras estavam prestes a sair de sua boca, ele mudou de ideia e disse: “Porque desde o dia em que nasci, eu estava destinado a ser seu cavaleiro. Este é o meu fardo.”
“Então você pode ir embora, Qiong”, disse A-Tai. “A shifu disse que eu não sou mais o Príncipe Sassânida, e você não é mais o cavaleiro do príncipe.”
Eles caminharam até a frente do Templo Sagrado. Ambos sabiam que se o Reino Sassânida ainda existisse neste mundo, então só restavam duas pessoas neste reino: Tegla e Ashina Qiong sob o céu noturno.
“Muito bem”, disse Ashina Qiong, no final.
Esses dois sobrenomes, que por milênios brilharam nas terras persas e foram contados em inúmeras histórias antes de dormir, em noites sem sono, finalmente chegaram ao fim de sua jornada nesta noite.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
【se você não estiver lendo no Dianxia Trads saiba que está lendo em site ladrão! 】
Ashina Qiong começou a arrumar suas coisas, enquanto A-Tai observava silenciosamente do lado de fora do quarto.
Ashina Qiong arrumou suas coisas muito lentamente, embora tivesse muito pouco. De repente, ele parou, percebendo que, na verdade, não precisava de nada.
“Vou deixar todo esse dinheiro para você”, disse Ashina Qiong.
Havia muitas moedas novas, tanto de ouro quanto de prata, com a imagem do califa impressa na velha bolsa de dinheiro.
Quando a sacerdotisa ainda estava viva, havia muito poucas oferendas no Templo Zoroastriano. A cada dez dias, Ashina Qiong cortava as rosas no jardim, pacientemente removia os espinhos e as levava para a cidade de Bazin para vender.
“Eu não preciso disso”, disse A-Tai. “Você pode levar com você.”
“Sua Alteza”, disse Ashina Qiong, “você vai morrer de fome. Venha, isso também é para você.”
Ashina Qiong colocou uma adaga sobre a bolsa de dinheiro. Era a adaga que A-Tai tirou da cintura de Ashina Qiong no dia em que se conheceram, com a intenção de cometer suicídio diante dos soldados vestidos de preto.
“Cuide de si mesmo”, disse Ashina Qiong, trocando para as roupas de um viajante e saindo do quarto.
No entanto, as tochas no sopé da montanha já estavam serpenteando.
A notícia da morte da sacerdotisa se espalhou por todo o Mar de Aral em poucos dias. A última pessoa que o Califa temia estava morta, então os soldados vestidos de preto não hesitaram mais, avançando diretamente e ocupando toda Bazin, subindo a montanha.
Dessa vez, não havia tropas Tang para resgatá-los.
Ashina Qiong ouviu os gritos e saltou para a muralha do templo, vendo milhares de soldados árabes avançando contra o templo sem encontrar qualquer resistência.
“Vamos!” Ashina Qiong disse. “Eles estão aqui de novo!”
A-Tai não respondeu, se virou e saiu do Templo Sagrado. Depois de trocar de roupa para suas vestes de sacerdote, ele rapidamente caminhou até o Salão das Brasas e se ajoelhou em frente ao altar.
“Você está louco!” Ashina Qiong gritou.
“Eu ficarei aqui”, disse A-Tai com a voz ligeiramente trêmula, mas rapidamente recuperou a calma e, em voz baixa, acrescentou, “Sua missão também finalmente terminou… Qiong, vá embora, não precisa mais me proteger.”
Ashina Qiong olhou incrédulo para fora do templo. A-Tai segurou a adaga e a colocou na frente do altar, sussurrando: “Durante todos esses anos, a Chama Sagrada me ensinou que o fogo proporciona calor às pessoas, e não destruição…”
Ashina Qiong rugiu: “Eu não me importo com o que você pensa de si mesmo! Vá embora! Você tem que ir embora!”
Os portões do Templo Sagrado ruíram com um estrondo alto, e o exército árabe finalmente conseguiu atacar.
Mas diante de dois jovens quase adolescentes, era quase uma carnificina sem esperança.
“Vá!” Ashina Qiong fez o melhor que pôde. Seu corpo estava coberto de sangue, e os sons de matança eram intermináveis. Era como se ele tivesse retornado ao dia em que nevou em Bagdá.
Os arredores do Templo Sagrado estavam completamente cercados. Ashina Qiong rastejou em direção a A-Tai por uma poça de sangue. Seus lábios manchados de sangue se moveram levemente, mas ele não conseguiu dizer nada. Um sorriso amargo apareceu em seu rosto.
“Eu… Tegla”, Ashina Qiong sussurrou. “Para evitar que você seja humilhado, eu só posso…”
Ashina Qiong segurou a adaga em sua mão e pressionou o ombro de A-Tai. A-Tai gentilmente o abraçou em frente ao altar e o deixou deitar em seus braços enquanto segurava a adaga. O sangue deles escorreu pelo corpo de Ashina Qiong.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Naquela noite, em Hégira, em Ctesifonte, e até mesmo em Bagdá, a milhares de li dali, centenas de milhares de pessoas ouviram um conto que se tornaria imortal.
A Chama Sagrada do templo de Bazin brilhou intensamente, formando um pilar de luz que alcançou o céu ——
A adaga na mão de Ashina Qiong reuniu o poder suave das chamas, varrendo como um vendaval.
A Chama Sagrada foi reacendida, destruindo instantaneamente quase metade do templo.
Ashina Qiong olhou para A-Tai perplexo.
De dentro das chamas, uma voz veio de longe:
“Você finalmente encontrou o que precisa proteger…”
“A Chama Sagrada lhe deu uma nova chance de vida, longe de ser destruição…”
Ashina Qiong: “Eu…”
“Agora, restam só nós dois Sassânidas”, A-Tai disse em voz baixa.
Na chama furiosa, o Céu e a Terra se encheram de luz, espalhando-se esmagadoramente como um mar de ouro.
“Mas eu acredito”, A-Tai disse suavemente, “não importa onde formos, a chama nunca se extinguirá…”
“Agora que penso nisso, aqueles foram os dias mais felizes de nossas vidas.”
“É mesmo? Sinto que os dias mais felizes ainda estão a muitos anos de distância. Eles ainda não chegaram de verdade.”
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Depois daquele dia, as brasas no Templo de Bazin foram subitamente extintas, e não havia mais Chama Sagrada no mundo.
Mas A-Tai e Ashina Qiong, o príncipe e o cavaleiro, pareciam ter renascido.
O templo estava em ruínas, e as cinzas no altar se espalharam com o vento. A-Tai fez as malas e embarcou na estrada para o mundo com Ashina Qiong.
Ashina Qiong franziu a testa em confusão enquanto guardava o alaúde de A-Tai. De fato, tampura, alaúde, pipa²… ele nunca conseguia distinguir esses instrumentos. Eles usaram o pouco dinheiro que restava para comprar uma carroça. Durante o dia, passavam pelos vilarejos ao longo do caminho, partindo de Bazin, atravessando a Anatólia — naquela época, um lugar mais distante do ocidente, chamado de “Ásia Menor”.
A-Tai tocava instrumentos para as crianças, observando seus sorrisos alegres. Às vezes, Ashina Qiong pegava algumas facas de arremesso e fazia malabarismos, acompanhando A-Tai para divertir as crianças.
“Vamos”, A-Tai sorriu, “Hǎi miè hóu bǐ, até a próxima vez——”
“O que você quer fazer?” Ashina Qiong pulou na carroça e sacudiu as rédeas. “Para onde estamos indo?”
“Vá para o lugar onde outro sacerdote nasceu”, disse A-Tai.
Eles viajaram ao longo das fronteiras da Ásia Menor, chegando à costa do Mediterrâneo. Nas águas claras, Ashina Qiong arregaçou as calças e caminhou descalço para dentro do mar, jogando seixos lisos em direção à superfície. A-Tai, com o cabelo longo solto, sentou-se no cais branco, dedilhando suavemente o instrumento em suas mãos.
Ashina Qiong perguntou: “Você consegue sentir a Chama Sagrada?”
“Está em nossos corações”, disse A-Tai. “Ahura dividiu a chama em duas e nos deu. Você não consegue sentir?”
Ashina Qiong tinha uma expressão indescritível no rosto. Ele balançou a cabeça e olhou para longe.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Naquele ano, eles foram a Atenas e Roma, foram a Jerusalém, no topo das montanhas da Judeia. Seguindo os mercadores de seda do Oriente, partiram de Chang’an e chegaram à Veneza. Ashina Qiong remava uma pequena gôndola, carregando A-Tai, através dos canais de Veneza.
Naquele ano, A-Tai tornou-se uma pessoa famosa e conhecida por todos.
Depois de deixar a costa do Mediterrâneo, A-Tai e seu cavaleiro retornaram à Mesopotâmia. Já se passaram quatro anos desde que eles deixaram o templo da Chama Sagrada. O Crescente Fértil agora fazia parte dos territórios islâmicos. No entanto, nesta terra, Ashina Qiong finalmente viu o que a sacerdotisa havia dito: “As brasas nunca serão extintas”.
Embora não haja mais chamas no templo sagrado, os sassânidas que viveram nesta terra ainda anseiam pelo calor e entusiasmo da chama.
Os sorrisos das crianças, a tristeza nos olhos dos mais velhos, a esperança do povo sassânida para o futuro.
“Todos eles sabem quem somos.” A-Tai dedilhou as cordas e tocou um som tão frio quanto uma fonte gelada.
“Mn.” Ashina Qiong disse. “Só que ninguém fala.”
Ashina Qiong pouco a pouco compreendeu o significado de tudo o que seu príncipe havia feito.
“A Chama Sagrada perguntou a você”, disse Ashina Qiong, “sobre o verdadeiro significado de orar pela Chama Celestial?”
Com um sorriso nos lábios, A-Tai olhou para as costas de Ashina Qiong que conduzia a carroça e não respondeu.
Ashina Qiong disse para si mesmo: “O pai disse que se você quer obter o favor da Chama Sagrada, você deve ter alguém em seu coração que esteja disposto a protegê-lo.”
“Para esta pessoa, ou para estas pessoas”, disse Ashina Qiong, “Mesmo que fossem queimados até as cinzas nas chamas, eles não teriam medo.”
A-Tai ainda não respondeu. Ashina Qiong acrescentou levemente: “Então, naquela noite no templo, quando as brasas foram reacendidas…”
A-Tai dedilhou as cordas e respondeu a Ashina Qiong com uma canção, enquanto cavalgavam para longe sob o céu estrelado.
O nome do místico ecoou no Crescente Fértil, cada centímetro de terra que já foi governado pelos sassânidas, mas agora estava nas mãos do califa.
Ashina Qiong descobriu que poderia invocar milagrosamente o poder do Deus do Fogo. Em uma guerra não muito depois, ele e A-Tai entraram no campo de batalha e ajudaram as tribos no sopé da montanha a repelir a invasão do exército vestido de preto.
E logo após o fim da guerra, um homem mascarado chegou à frente de sua carroça e retirou o véu.
“Amman?!” Ashina Qiong ficou surpreso.
A-Tai ainda estava sentado na carruagem, em silêncio.
Amman, junto com os guerreiros que se esconderam na Guarda do Califa após a queda do Império Sassânida, fez um gesto simples e ajoelhou-se em um joelho diante de A-Tai.
“Finalmente o encontramos, Príncipe Isai”, Amman disse suavemente.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Na noite de inverno daquele ano, as luzes do Templo Sagrado foram acesas novamente. Como seu pai e tio, A-Tai aceitou a lealdade do povo do império caído. Ashina Qiong, já acostumado com sua identidade, permaneceu fielmente ao lado de A-Tai, sem dizer uma palavra.
“Contanto que você mostre um milagre ao povo, o Império Sassânida definitivamente será restaurado!” Amman disse.
“Sua Alteza”, o resto do povo disse. “Deixe a Chama Sagrada reacender!”
“Ainda temos dezenas de milhares de pessoas”, Amman disse a A-Tai. “Estamos esperando o retorno de Isai…”
“Voltem para suas vidas”, disse A-Tai. “Eu não serei mais como meu pai e meu tio.”
O Templo Sagrado ficou em silêncio.
Em meio ao silêncio, A-Tai disse lentamente: “Meu povo vive nesta terra para sobreviver, não para matar. Apenas confiando em milagres, posso despertá-los para lutar por mim, mas no final, será apenas outra matança que durará vários anos… O trono de Isai já está manchado de sangue, uma restauração assim, eu prefiro não ter.”
Amman disse: “Você vai descobrir um dia.”
“Eu vou.” A-Tai sorriu. “Mas não agora, Amman.”
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Depois daquela noite, Ashina Qiong ficou no pátio a noite toda.
“Vamos embora”, disse Ashina Qiong. “Eu suspeito que a pessoa que nos delatou ao califa quando éramos crianças foi Amman.”
“Ele não trará ninguém para nos capturar”, disse A-Tai. “Não se preocupe.”
Após retornarem ao Templo Sagrado, Ashina Qiong e A-Tai retomaram suas vidas de infância. Eles não disseram uma palavra por um longo tempo, mas ambos sabiam muito bem que um dia o Império Sassânida seria restaurado sob a luz da Chama Sagrada.
“O que você está pensando?” Ashina Qiong perguntou a A-Tai.
“Toda a família Isai tem a loucura gravada em seu sangue”, disse A-Tai suavemente. “Às vezes me pergunto: qual teria sido o resultado se as tropas Tang tivessem chegado mais cedo naquele dia?”
“Você quer ir para o Grande Tang das Planícies Centrais?” Ashina Qiong perguntou. “Agora já não é como há vinte anos. Eles podem não te ajudar.”
“O Khan Celestial prometeu ao meu pai e à minha família”, disse A-Tai suavemente, levantando a mão para dedilhar as cordas da cítara e produzindo uma série de sons claros.
“Posso convocar todos os sassânidas para você”, disse Ashina Qiong, “você estiver disposto a liderá-los, eu vivo para isso e, naturalmente, morrerei por isso. O filho do Sábio Guerreiro Delan nunca teme.”
A-Tai não respondeu e saiu do salão principal.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Pouco tempo depois, Amman começou a visitar com mais frequência, oficialmente para verificar se as habilidades de Ashina Qiong realmente podiam proteger o Príncipe Tegla, mas, na realidade, ele queria discutir com A-Tai o plano para restaurar o país.
Ashina Qiong naturalmente não foi gentil com Amman, lutando sem piedade contra ele no jardim.
Até outro dia, a lendária princesa da pradaria, a pérola do Crescente Fértil, filha de um mercador incrivelmente rico, Turandokht, veio ao Templo de Bazin.
Ela estava com o rosto coberto por um véu, suas joias tilintando enquanto caminhava rapidamente pelo longo corredor, chegando à frente do Sumo Sacerdote.
“Ouvi dizer que ainda há brasas da Chama Sagrada aqui. Deixe-me prestar meus respeitos”, disse Turandokht suavemente.
Do lado de fora do pátio, Ashina Qiong e Amman pararam seu duelo e olharam juntos para dentro do templo.
“As brasas já desapareceram”, A-Tai fez uma oração e olhou para Turandokht de lado, dizendo, “Mas a chama nunca se apagou, ela está dentro de cada coração.”
“Cem anos atrás”, Turandokht sussurrou, “a Grande Sacerdotisa pediu à nossa família para encontrar a relíquia do Rei Akele, dos Hu, para ela. Nós a encontramos e trouxemos especialmente para você. Talvez já não tenha utilidade, mas considerem como a realização de um desejo.”
Turandokht abriu a mão para A-Tai, revelando quatro anéis de cores diferentes.
Ashina Qiong abaixou sua arma e observou Turandokht em silêncio.
“Eu acho”, Amman disse com um sorriso, “que teremos uma nova rainha.”
Ashina Qiong olhou para Turandokht em silêncio. Ela levantou o véu para revelar seu rosto, enquanto A-Tai olhava atentamente para seus olhos.
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Alguns anos depois, A-Tai foi até o altar e de repente encontrou uma carta aparecendo do nada no altar onde as brasas eram adoradas.
Isso o fez perceber que o destino que sua shifu, a sacerdotisa, mencionou estava finalmente se revelando para ele naquele momento.
“Qiong?!” A-Tai saiu rapidamente com a carta na mão, incrédulo, “foi você quem colocou esta carta no altar?”
Ashina Qiong pegou a carta e olhou para as palavras: “Departamento de Exorcismo da Grande Tang” no envelope com uma expressão perplexa.
“Então, neste mundo, o chamado ‘destino’ realmente existe.”
⊱───────⊰⊹⊱✫⊰⊹⊱───────⊰
Ashina Qiong abaixou a taça de vinho e sorriu. Ele franziu a testa e disse: “O vinho do Passo Yang não é bom.”
Em meio ao vento e areia soprando, A-Tai se apoiou na cítara e sentou-se do lado de fora do posto de correio com Ashina Qiong.
Esta despedida estava finalmente chegando ao fim.
“A chuva da manhã em Weicheng umedece a leve poeira³—” A-Tai dedilhou a cítara e cantou em voz baixa, “A pousada, serena e fresca, os salgueiros, renascidos pela primavera.”
Ashina Qiong olhou fixamente para a expressão embriagada de A-Tai enquanto tocava a cítara.
Era uma canção que vinha do oriente, mas, neste vasto deserto, não havia salgueiros nem chuva no Passo Yang. Se houvesse pessoas da Grande Tang aqui, provavelmente lhes diriam que a chuva matinal e a cor dos salgueiros se referem a Weicheng, na distante Chang’an—
Aquele lugar de prazeres sensuais e de grande agitação e prosperidade—
Era um mundo novo que era completamente diferente das Regiões Ocidentais.
“Eu aconselho você a beber outra taça de vinho”, A-Tai cantou suavemente. “Deixando o Passo Yang no oeste, não haverá velhos amigos…”
Ashina Qiong sorriu. Esta foi a primeira vez que eles se separaram desde que se conheceram quando crianças.
“Cuide-se na Grande Tang”, disse Ashina Qiong. “Príncipe.”
“A situação que você enfrentará é mais perigosa que a minha. Você tem que se cuidar”, A-Tai disse seriamente olhando nos olhos de Ashina Qiong, “Cavaleiro.”
Ashina Qiong disse: “Eu não vou morrer. Enquanto você estiver vivo, eu esperarei pelo seu retorno.”
“Então”, A-Tai respondeu com um sorriso, “é um acordo.”
Ashina Qiong levantou a mão, batendo-a na mão de A-Tai, depois montou em seu cavalo e partiu do Passo Yang.
A-Tai se despediu de Ashina Qiong e olhou para o oeste, seus olhos cheios de saudade. Ele então montou seu cavalo e entrou no Passo Yang, seguindo ao longo da Rota da Seda em direção a Shazhou, Passo Jiayu e Chang’an.
Em direção àquele mundo vasto e distante, a chuva cai em Weicheng renovando todas as coisas.
—— · Fim· ——
⊱───────⊰✯⊱───────⊰
Notas:
1 天可汗, que pode ser traduzido como “Khan Celestial” ou “Khan do Céu”, é um título honorífico utilizado durante a dinastia Tang na China para se referir ao imperador. O título expressava a supremacia e autoridade celestial do imperador sobre outros governantes, enfatizando seu papel como líder supremo não apenas da China, mas também das regiões vizinhas e tribos nômades. Este título refletia a visão dos imperadores Tang como governantes universais, com um mandato divino para governar sob o céu.
2 普拉琴 (Pǔ lā qín): Este termo não é claro em chinês, mas pode ser uma referência a um tipo de cítara ou um instrumento similar.
鲁特琴 (Lǔ tè qín): Esse é o nome chinês para o alaúde. O alaúde é um instrumento musical de cordas que se originou no Oriente Médio e se espalhou pela Europa na Idade Média e Renascença. Possui um corpo em formato de pera e várias cordas que são dedilhadas.
琵琶 (Pípá): A pipa é um instrumento tradicional chinês de cordas dedilhadas, com um corpo em forma de pêra e quatro ou cinco cordas. É tocado com os dedos ou com palhetas, e é conhecido pelo seu som melodioso e versatilidade.
3 渭城朝雨浥轻尘, é um verso de um famoso poema chinês chamado “送元二使安西” (Enviando Yuan Er para Anxi), escrito pelo poeta da dinastia Tang, Wang Wei.
4 西出阳关,无故人 é um verso do poema “送元二使安西” (Enviando Yuan Er para Anxi) de Wang Wei. Esse verso expressa a melancolia da despedida, sugerindo que, ao deixar o Passo Yang e seguir para o oeste, a pessoa se afastará de amigos antigos e conhecidos.
⊱───────⊰✯⊱───────⊰